segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Amar é ter um pássaro pousado no dedo


Quem tem um pássaro pousado no dedo sabe que, a qualquer momento, ele pode voar




Rubem Alves

sábado, 28 de setembro de 2013

Setembro foi mês de venenosas claridades


Vou fazer-te uma confidência, talvez tenha já começado a envelhecer e o desejo, esse cão, ladra-me agora menos à porta.
Nunca precisei de frequentar curandeiros da alma para saber como são vastos os campos do delírio.
Agora vou sentar-me no jardim, estou cansado, Setembro foi mês de venenosas claridades,
mas esta noite, para minha alegria, a terra vai arder comigo. Até ao fim.




Eugénio de Andrade

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Não posso adiar o coração


Este homem que pensou
com uma pedra na mão
tranformá-la num pão
tranformá-la num beijo
Este homem que parou
no meio da sua vida
e se sentiu mais leve
que a sua própria sombra




António Ramos Rosa

domingo, 22 de setembro de 2013

Eu


Sou uma pergunta insistente, sem que eu ouça uma resposta.
 Nunca ninguém me respondeu.




Clarice Lispector
(foto de Katia Chausheva)

sábado, 21 de setembro de 2013

De passagem


a mulher com o medo nas mãos,
na vida é apenas uma chama frágil
a esperar que o mundo lhe consuma
o medo apertado na garganta,
a voz inexistente.
 
cantam os pássaros,
tudo está aceleradamente de passagem




Silvia Chueire

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Boa noite


Senhor libertai-nos do jogo perigoso da transparência
No fundo do mar da nossa alma não há corais nem búzios
Mas sufocado sonho
E não sabemos bem que coisa são os sonhos
Condutores silenciosos canto surdo
Que um dia subitamente emergem
No grande pátio liso dos desastres








Sophia de Mello Breyner Andresen

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Pedro


Contavam as sereias que na tempestade dos seus olhos
os barcos adormeciam tontos, cansados das marés;
que os seus beijos sabiam a mar e que na sua pele crestada
pelo sol havia a cintilância das ondas ao meio-dia;
que os seus ombros lembravam promontórios e que neles
as mulheres deixavam naufragar as mãos e os lábios;
que uma noite tocara a lua com os seus dedos-mastros
e ouvira uma voz dentro de si, vinda de muito longe;
que era hábil com as redes, como com as palavras.
 
Alguém veio pedir-lhe que abandonasse os peixes
pelos homens. Em troca, receberia
um templo eterno, uma chave, o privilégio de decidir
todos os lugares da chuva, um nome novo
para poder negar o que vira antes.




Maria do Rosário Pedreira

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Digo


que faço mapas das lágrimas
mais do que água é inventar paisagens onde
te faço memória
qualquer coisa entre o olhar e o vazio
de dizer palavras contadas pelos dedos




Maria Sousa

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Às vezes


O poema é uma escada
que os olhos descem
enquanto a alma sobe
e,
contudo,
às vezes,
caio no fundo de mim.




Miguel Martins (do seu blog)

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Ai...

 

o primeiro copo, o primeiro corpo, o primeiro amor
 
 
 

domingo, 8 de setembro de 2013

Palavras macias


veludo   assombro   desalinho  segredo  pele  vento  
silêncio   cal   cumplice   asa   ternura   azul  
amante   noite  mar   magnolia   poema   suave  
colo   espera   musica   abraço   gato   caricia





ana p.
 

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Fora do Lugar


A dor é uma desordem inimiga
das palavras com o silêncio todo fora
do lugar. Saberemos tomar um caminho
por essa floresta escura? Poderemos sequer recuperar a pequena bússola partida,
a caneta e o papel, as nossas certezas de trazer no bolso?
Não nos avisaram contra o medo,
não nos disseram que pode chegar
a qualquer hora, deslealmente,
enquanto o sol dorme na paisagem e as ervas
se levantam para receber o Verão. E agora
que quase nos perdemos, sem mapa ou sentido
que nos sirva, o nosso único guia é o amor
dos que nos esperam numa sala branca
onde o chão nos falta e não há estações.




Rui Pires Cabral

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Quarentena


Fechamos o corpo
como quem fecha um livro
por já sabê-lo de cor....




Paulo Leminski

terça-feira, 3 de setembro de 2013