quinta-feira, 14 de maio de 2015




Ele não apareceu.
 Talvez tenha adoecido ou ficado debaixo de
 um eléctrico. Talvez outra pessoa se pusesse na conversa com ele. 
Talvez se tenha esquecido do relógio, 
ou o relógio se tenha esquecido de lhe dar o tempo certo. 
Talvez o carro não pegasse,
 ou tenha ficado avariado a meio do caminho. 
Talvez alguém lhe telefonasse quando ia a sair de casa,
 dizendo-lhe que tinha de ir a um funeral 
ou que a mãe dele tinha morrido. 
Talvez tenha encontrado um antigo conhecido. 
Talvez tenha tido uma discussão no emprego,
 tenha sido despedido e esteja a esconder 
a cabeça debaixo de uma almofada. 
Talvez a ponte estivesse fechada e
 a seguinte também. 
Talvez o semáforo permanecesse vermelho. 
Talvez o multibanco tenha engolido o cartão
 ou a meio do caminho tenha reparado que se esquecera 
do porta-moedas.
 Talvez tenha perdido os óculos,
 não conseguisse deixar de ler, 
houvesse um programa que ele queria acabar de ver, 
não conseguisse dar a volta à fechadura da porta, 
não encontrasse as chaves em sítio nenhum e 
o cão dele de repente começasse a vomitar. 
Talvez não houvesse um telefone por perto, 
não encontrasse o restaurante 
ou esteja à espera noutro sítio, por engano.
 Talvez – a última possibilidade, 
incompreensível e inesperada – 
ele tenha deixado de me amar.





 Hagar Peeters
 (Foto de Natalia Drepina)