Acordo sem o contorno do teu rosto na minha almofada, sem o teu peito liso e claro como um dia de vento, e começo a erguer a madrugada apenas com as duas mãos que me deixaste, hesitante nos gestos, porque os meus olhos partiram nos teus
segunda-feira, 31 de julho de 2017
sábado, 29 de julho de 2017
é sempre a mesma voz que não perdoa
Eu vi o sobressalto.
Nesse bosque de lâminas e luvas
tocaste cada coisa como
um grito.
E amaste a minha boca
como quem corta
os pulsos ao silêncio.
Se o vento te derrama
entre folhas e cinza
é sempre a mesma voz que não perdoa
a mesma lei
o mesmo labirinto
Armando da Silva Carvalho
sexta-feira, 28 de julho de 2017
o amor está de volta
Se as tuas noites não têm mais fim
Se um desalmado te faz chorar
Deixa cair um lenço
Que eu te alcanço
Em qualquer lugar
quarta-feira, 26 de julho de 2017
dá-me para a melancolia
Só mais um dia,
um dia luminoso e barulhento
por mim a dentro,
um dia bastaria,
em prosa que fosse.
Mas dá-me para a melancolia
para a limpeza, para a harmonia,
impacientam-me as migalhas
de pão na mesa, as falhas
da pintura do tecto,
as vozes das visitas, despropositadas,
sinto-me sujo como um objecto,
desapegado, desarrumado.
Trocaria bem esse dia
por um pouco de arrumação
- no quarto e no coração.
Manuel António Pina
sexta-feira, 21 de julho de 2017
certos amores
Tenho saudades, dizias.
Saudades do que foi, do que está a ser, do que será, sobretudo do que não será
Manuel Alegre (A Terceira Rosa)
quinta-feira, 20 de julho de 2017
quarta-feira, 19 de julho de 2017
terça-feira, 18 de julho de 2017
É já tempo de não esperar ninguém.
Passa o amor, fugaz e silencioso
como ao longe um comboio nocturno
Não resta ninguém, é hora
de voltar
ao desolado reino do absurdo,
a sentir culpa, ao vulgar medo
de perder o que já estava perdido.
À inútil e sórdida moral.
É já hora de dar por vencido
no trabalho,
a sós, outro Inverno.
Quantos faltam ainda, e que sentido
tem esta vida onde te procurei,
se chegou já a hora tão temida
de comprovar que nunca exististe?
Joan Margarit (tradução de Vasco Gato)
(Foto de Katia Chausheva)
segunda-feira, 17 de julho de 2017
desfolhando relâmpagos sobre mim
A magnólia,
o som que se desenvolve nela
quando pronunciada,
é um exaltado aroma
Perdido na tempestade
Luiza Neto Jorge
domingo, 16 de julho de 2017
vazio de sinais
Estava tudo depurado de vida,
isento,
vazio de sinais, e depois disse para comigo:
vou começar a escrever
para me curar da mentira de um amor que acaba.
Marguerite Duras
terça-feira, 11 de julho de 2017
o que eu quero
Não tenho paciência para ouvir os outros, não tenho paciência para viver,
não tenho paciência para morrer,
estou aqui, parada, num desequilíbrio interminável,
nunca mais acabo de cair,
irrito-me se me falam, sofro se me não dizem nada,
odeio o gesto caridoso:
a mão de alguém nos meus cabelos,
o que eu quero é uma voz que me queira,
um momento de descanso nessa voz.
Rui Nunes
(Foto de Katia Chausheva)
quinta-feira, 6 de julho de 2017
as cartas marcadas
Definitivamente, é o meu Outono,
um tempo de alianças impossíveis,
a idade vermelha de todos os perigos
para homens maduros e miúdas solitárias.
A idade do adultério e do olvido
sem nenhuma esperança, a idade fria,
a partida final contra nós mesmos.
Mantenho-me à mesa, sem esperar a sorte,
neste jogo já não entra o azar.
É o tempo de fazer uma paciência
com as cartas marcadas da vida.
Joan Margarit
terça-feira, 4 de julho de 2017
segunda-feira, 3 de julho de 2017
quero saber se ficarás comigo no meio do incêndio
Quero saber o que te sustenta a partir de dentro, quando tudo o mais se desmorona.
Quero saber se consegues ficar sozinho contigo mesmo e se, realmente,
gostas da companhia que tens nos momentos vazios.
Jean Houston
(Foto de Anka Zuravleva)
sábado, 1 de julho de 2017
nada
la muerte se muere de risa
pero la vida
se muere de llanto pero la muerte pero la vida
pero nada nada nada
Alejandra Pizarnik
(Foto de Anka Zuravleva)
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