"Vesti-me de sombra e senti o silêncio pousar-me
no coração"
Acordo sem o contorno do teu rosto na minha almofada, sem o teu peito liso e claro como um dia de vento, e começo a erguer a madrugada apenas com as duas mãos que me deixaste, hesitante nos gestos, porque os meus olhos partiram nos teus
segunda-feira, 30 de novembro de 2015
domingo, 29 de novembro de 2015
Preciso de ti para um poema
Ofereço-te em troca o meu auto-retrato sincero. Tenho quarenta livros prontos para serem lidos. Tenho uma estratégia infalível para implementar a primavera. Tenho a segurança de um corpo cheio de insónias, pele de galinha, súbitos arrepios, termómetros para novecentas febres, saliva muito devagar, pés descalços, arrebatamentos incomunicáveis, fins de noite numa garrafa de vinho, estilhaços de quatrocentos orgasmos, comoções, paixões flagrantes, primeiros cuidados para jovens suicidas, lâmpadas que se queimaram nas minhas próprias mãos.
Vasco Gato
sábado, 28 de novembro de 2015
quarta-feira, 25 de novembro de 2015
segunda-feira, 23 de novembro de 2015
domingo, 22 de novembro de 2015
sábado, 14 de novembro de 2015
Isto não é Paris
Isto não é Paris
nem são cinco da tarde
nem chove
nem há cómicos na rua
e tampouco nesta esquina
desta cidade que não é Paris
há um realejo surpreendido
e um pintor boémio
e uma garrafa de vinho
porque às cinco da tarde
esta cidade não é Paris
e não existe um amor curioso
escondido atrás da cortina
enquanto Edith Piaf canta
Les amants de Paris
Nem a recordação do Sena
me leva as minhas memórias tristes
desta cidade sem noite
nem espelhos de mel
e não minto se disser
que Paul Éluard saiu do meu quarto
com asas de melro branco
pela janela desta cidade
que não tem pombas nem bêbados alegres
porque às cinco da tarde
esta cidade não é Paris.
Uberto Stabile
(Foto de Robert Doisneau )
quarta-feira, 11 de novembro de 2015
terça-feira, 10 de novembro de 2015
Não invoques a de ontem porque ela já foi embora
Desde que tu partiste morreu já muitas vezes
E embora tenha renascido já nunca foi a mesma
Mais frágil mais ingénua mais tímida umas vezes
outras vezes mais sábia mais triste mais murcha
Mas sempre distinta e outra vez sempre
Às vezes conformada mais cheia do meu sangue
como se tudo fosse novo tudo recém comprado
água sol e ar e sombra
Tão resignada que até sorrio ao espelho que não
Tenho frente a mim
E outras vezes em guerra tão em guerra
que o meu tacto é punhal que me agride as veias
e as flores me ferem e o céu me criva
e até o meu próprio corpo me danifica
- Morro e volto a nascer a cada manhã
a angustiada de ontem hoje não a busques
A eufórica de hoje
talvez esta mesma noite se suicide
abraçada ao travesseiro
Josefina Plá
(Foto de Josephine Cardin)
segunda-feira, 9 de novembro de 2015
quinta-feira, 5 de novembro de 2015
quarta-feira, 4 de novembro de 2015
Se um dia me pedires,
juro que te empresto
o meu coração, tal como
guardei na boca o pequeno deus
que te trazia tão curioso.
A sério. Deixo-te tocar nele,
sentir-lhe o peso, atirá-lo
contra a parede para depois
o apanhares e retirares a pele
de pêssego demasiado maduro.
Podes até queimá-lo -
com cuidado, por favor -
quando estiver mais frio;
ou enterrar os restos debaixo
das estrelícias, de propósito
por saberes que não as suporto.
Em troca, promete-me apenas
que depois me deixas fugir
para saber como é isso de
passar o resto da vida desembaraçada
finalmente desse peso morto.
Inês Dias
(Foto Christian Schloe)
terça-feira, 3 de novembro de 2015
segunda-feira, 2 de novembro de 2015
Os meus dedos já souberam
de cor a perfeição.
A morte era o menos.
Só a beleza nos parecia intolerável
se não a despedaçássemos,
voz por voz, compasso a compasso,
numa harmonia mais dócil. Menos urgente
do que os músculos que ensaiávamos
todos os dias sem nos tocarmos.
Agora ouço outras mãos
a tactear o mesmo mistério e
é como segredar, pianississimo,
ao ouvido de alguém demasiado longe,
quando afinal adormeceste apenas
dentro de mim, com as garras
cravadas ao de leve na memória
Inês Dias
(Foto de Natalia Drepina)
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