Quando já nem do amor eu souber escrever. Quando as palavras forem mais densas que a dimensão dos sentimentos, quando este peso duro alcochoar no musgo o cessar da minha fome. Quando for demasiado tarde no exílio dos meus sentires, quando à caneta lhe faltar a tinta do meu corpo em prosa, e da prosa a frase se fizer desfeita no meu peito em branco. Quando, e quanto amor escalpado, vazio como todas as outras peles que desconsolo no meu abandono. Quando já nem do amor eu souber ler, esquecida na lacuna dos teus olvidos. Quando os lugares que por nós imaginei sucumbirem no vendaval das tuas emoções. Deixa ficar a louça gasta dos anos transpostos, deixa ficar a cama desfiada em tapeçaria bordeaux. Deixa ficar um simples copo de água encadeado no reflexo de um caudal maior. Quando já nem do amor me lembrar que me sucedeste, e de dor atordoada sem dedos que me recortem as palavras, eu fingir esquecer que um dia também eu te aconteci - foi porque morri na reunúncia dos teus sentidos.
Alice Turvo
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