terça-feira, 1 de maio de 2012

Era um corpo


Era um mês incerto, havia vento,
eu não teria nascido ainda, ou já teria morrido.
A fronteira entre luz e sombra era muito difusa.
 Então estranhamente o sol pousou naquele corpo.
Corpo que nunca vira despido, que cheirava a maçãs maduras,
com brilhos que desciam às negras sementes da vida.
Estranhamente o sol demorou-se nos seus ombros.
 Um último brilho, ou suspiro, desprendeu-se.
O ar tremia – apesar disso eu era feliz,
Tinha dez ou mil anos, já não sei.


Eugénio de Andrade