segunda-feira, 18 de novembro de 2019

de ti



Havia meses que não escrevia
 nem um único poema. 
 Vivia com humildade, lendo os jornais,
 pensando no enigma do poder 
 e nas causas da obediência.
 Olhava para os pores-do-sol
 (escarlates, cheios de inquietação),
 escutava o emudecimento das vozes dos pássaros 
 e o silêncio da noite. 
 Via os girassóis a pendurarem
 as cabeças ao lusco-fusco, como se um carrasco distraído
 passeasse por entre os jardins. 
 No parapeito recolhia-se
 a doce poeira de Setembro enquanto os lagartos
 se escondiam nas curvaturas dos muros. 
 Dava longos passeios,
 sedento duma coisa só:
 dum relâmpago, 
 duma mudança,
 de ti. 






 Adam Zagajewski

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