terça-feira, 20 de janeiro de 2015




Ferida que fica, após o amor, nas costas do corpo. 
Talho profundo, cheio de peixes e bocas vermelhas, 
onde o sal dói e arde o iodo, 
que tudo corre ao longo do navio,
 que deixa passar a espuma
 e tem um olho triste no meio. 
Na arte de navegar,
 como na arte do amor, 
nenhum marinheiro, nenhum capitão,
 nenhum amante, nenhum armador, 
ninguém pode evitar esta espécie de feridas, 
escoriações profundas, com o comprimento 
do corpo e a fundura do mar,
 cuja cicatriz não desaparece
 e que usamos como estigmas de passadas navegações, 
de outras travessias. Pelo número de escoriações
 do navio, sabemos o número das suas viagens;
 pelas escoriações da nossa pele, 
quantas vezes é que amámos. 





 Cristina Peri Rossi  (Trad. A.M.)
 (Foto de Laura Makabresku)