domingo, 18 de dezembro de 2016




O gato lembra-se de ti nos intervalos. Espera 
de olhos acesos as histórias que nos contas. 
Passeia-se inquieto sobre o meu parapeito e eriça 
o pêlo, cúmplice, quando pressente que regressas. 

 Chegas sempre de noite. Sei quem és e ao que vens 
e ofereço-te o silêncio de um pequeno quarto recuado,
 as sombras das traseiras na minha pele, o tempo 
de repetir um gesto inevitável. Ouço-te contar 
 a mesma lenda com lábios sempre novos. Aprendo-a
 e esqueço-a. Nunca a saberemos de cor, o gato ou eu. 

 Depois partes. Levas contigo a tua voz, mas a música
 fica. Eu fecho as portadas devagar. O gato mia baixo
 à janela. Ninguém acena: guardamos com os outros 
o segredo das tuas visitas. Ambos. O gato e eu. 






 Maria do Rosário Pedreira