quarta-feira, 16 de setembro de 2020

é preciso nunca fazer as coisas pela metade



Uma cidade escuta desolada 
O canto de um pássaro ferido 
É o único pássaro da cidade
 E foi o único gato da cidade 
Que o devorou pela metade 
E o pássaro deixa de cantar
 E o gato deixa de ronronar
 E de lamber o focinho
 E a cidade prepara para o pássaro 
Funerais maravilhosos 
E o gato que foi convidado 
Segue o caixãozinho de palha
 Em que deitado está o pássaro morto
 Levado por uma menina 
Que não pára de chorar 
Se soubesse que você ia sofrer tanto 
Diz-lhe o gato 
Teria-o comido todinho 
E depois teria te dito
 Que o tinha visto voar
 Voar até o fim do mundo
 Lá onde o longe é tão longe 
Que de lá não se volta mais 
Você teria sofrido menos
 Só tristeza e saudades

 É preciso nunca fazer as coisas pela metade. 







 Jacques Prévert
 (Foto de Laura Makabresku)

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