Falam de restolho, mas obriga-os a atravessar o campo ceifado, rouba-lhes os sapatos, os pés rasgar-se-ão a cada passada, e encher-se-ão de sangue. E de sangue. E de sangue. E o restolho tornar-se-á sinónimo de sangue. E não do amarelo dourado do entardecer. E por fim restolho e sangue serão a mesma coisa. E as moscas que os acompanharam na travessia, zumbindo, zumbindo, zumbindo, serão sangue. E uma ave perdida será sangue. E os gafanhotos serão sangue. E o meio-dia das cigarras será sangue. E o sangue cairá no sangue, alimentar-se-á do sangue. E eles olharão os dedos e gritarão. tenho as mãos sujas de sangue. Essa sujidade invadi-los-á. E as vísceras: sangue. E os ossos: sangue. E os olhos. E a luz. E conhecerão enfim a beleza dourada do restolho. E da tarde e da manhã se fez o interminável: o dia primeiro do sangue. Quando a voz se calou, o sangue estava por todo o lado
Rui Nunes
(Foto de Katia Chausheva)
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